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O QUE É COMUNIDADE?

Uma Perspectiva Sociológica

por Phil Bartle, PhD

traduzido por Sofia Ferreira Fernandes

INTRODUÇÃO

Um mobilizador, animador ou activista é alguém que tenta mover (activar, animar) uma comunidade. O material de formação neste web site é dirigido aos mobilizadores e aos seus gestores, fornecendo explicações acerca dos métodos para incentivar o movimento na comunidade.

Mas o que é uma comunidade?

A NATUREZA DAS COMUNIDADES

Tal como a maioria dos aspectos abordados nas ciências sociais, a comunidade não pode ser rotulada. Usamos frequentemente a palavra comunidade, mas nesta formação é importante perguntarmo-nos seriamente pela sua definição.

Primeiro, é essencial referir que uma "comunidade" é uma construção mental, um modelo. Não podemos observar uma comunidade inteira, não a podemos tocar, e não podemos experimentá-la directamente. Ver elefante. Tal como as palavras "monte" ou "floco de neve", uma comunidade pode adquirir várias formas, tamanhos, cores e localizações distintas, não existem duas iguais.

E por último, e mais importante, uma comunidade não se resume às pessoas que a constituem. Uma comunidade, de um modo geral, já existia antes dos seus actuais membros terem sequer nascido, e provavelmente continuará a existir mesmo depois dos seus actuais membros terem desaparecido. É algo que transcende cada um dos seus componentes, os residentes actuais ou os próprios membros da comunidade. Uma comunidade pode incluir membros que se mudaram temporariamente para outros locais. Eles podem planear um eventual regresso, mas nem todos o fazem.

Em determinados casos, uma "comunidade" pode nem sequer possuir um lugar físico, mas ser simplesmente demarcada por um grupo de pessoas que partilham um interesse comum. No entanto, neste material de formação, uma "comunidade" à qual um mobilizador dedica a sua atenção, geralmente pertence à categoria de comunidades com um lugar físico definido.

UMA COMUNIDADE É UMA CONSTRUÇÃO SOCIOLÓGICA

O conceito de comunidade não é apenas uma "construção" (modelo), é uma "Construção Sociológica." É um conjunto de interacções, comportamentos humanos com significado e expectativas entre os seus membros. Não se trata apenas de uma acção isolada, mas de um conjunto de acções que têm como base a partilha de expectativas, valores, crenças e significados entre os indivíduos.

Para compreender o modo como uma comunidade actua e muda, torna-se necessário aprender um pouco sobre a ciência sociologia. Um mobilizador é um cientista aplicado; um cientista social. Enquanto que um cientista puro está interessado no modo de funcionamento de algo em concreto, o cientista aplicado está interessado em possuir esse conhecimento e aplicá-lo para obter resultados úteis.

UMA COMUNIDADE POSSUI FRONTEIRAS POUCO CONCRETAS

Quando a comunidade identificada é uma pequena aldeia, separada de outras aldeias por uma distância de poucos quilómetros, numa área rural, as suas fronteiras parecem ser muito simples, quando se faz uma análise inicial. Pode considerar-se o padrão de interacções humanas como consistindo apenas de relações entre os habitantes dessa localidade, nessa aldeia.

Mas os seus habitantes também interagem com pessoas fora da aldeia. Casam-se com pessoas de localidades vizinhas ou distantes, e podem mudar-se de local ou, por outro lado, o cônjuge pode começar a residir nessa aldeia. A determinada altura, os habitantes da aldeia terão irmãs, irmãos, primos, pais ou familiares por afinidade que vivem noutros locais. A fronteira dessa comunidade não é bem delimitada.

AS COMUNIDADES PODEM ESTAR INSERIDAS NOUTRAS COMUNIDADES

Podem existir comunidades dentro de comunidades mais vastas, incluindo distritos, regiões, grupos étnicos, nações e outras fronteiras. Pode haver matrimónios ou qualquer outro tipo de interacção que estabelece uma ligação entre os dois lados das fronteiras nacionais.

AS COMUNIDADES PODEM MOVER-SE

Adicionalmente, quando a tecnologia não se baseia na horticultura local, os habitantes da comunidade podem ser fisicamente móveis.

Podem ser pastores nómadas que percorrem longas distâncias com o seu gado. Podem ser grupos móveis de pescadores que se deslocam frequentemente de acordo com a disponibilidade do peixe. Podem ser caçadores que se movem para seguir os animais de caça.

AS COMUNIDADE URBANAS SÃO ESPECIAIS

Nas áreas urbanas, uma comunidade pode ser um pequeno grupo de propriedades pertencentes a pessoas com uma origem comum. Essa comunidade, por seu lado, pode fazer parte de uma comunidade da vizinhança ou de um bairro ou de qualquer outro tipo de divisão urbana local.

À medida que as fronteiras se alargam, existe mais heterogenidade (diferenças de origem, língua, religião ou outras características que possam definir uma identidade comum). Por outro lado, também podem fazer parte de um município mais abrangente, que por sua vez faz parte da conglomeração que inclui toda a cidade.

Em geral (salvo algumas excepções), uma comunidade urbana tem mais fronteiras pouco definidas, é mais díficil de demarcar, mais heterogénea (variada, mista), mais complexa e mais díficil de organizar usando os métodos tradicionais de desenvolvimento de comunidades, e possui objectivos mais complexos e sofisticados do que as comunidades rurais.

UMA PERSPECTIVA SOCIAL DAS POVOAÇÕES

Uma povoação, ou comunidade, não é apenas uma mera aglomeração de casas. É uma organização humana (social e cultural). (As casas, que são produtos culturais da humanidades, pertencem a uma das seis dimensões da sociedade ou cultura: a dimensão tecnológica' como será explicado posteriormente).

Por outro lado, não se trata apenas de um conjunto de indivíduos; é um sistema sócio-cultural; é organizada socialmente. Ou seja, enquanto mobilizador é necessário conhecer alguns aspectos da sociedade - aspectos esses que são estudados pela sociologia.

A comunidade possui uma vida própria que transcende a soma de todas as vidas de todos os seus membros. Enquanto uma organização social, a comunidade é uma entidade cultural. Ver Cultura. Isto significa que é um sistema de sistemas, e que é composto de aspectos que são aprendidos e não transmitidos pelos genes e cromossomas. Todos os elementos sociais e culturais de uma comunidade, desde a sua tecnologia até às crenças comuns, são transmitidos e armazenados através de símbolos.

A Animação Social (promover a participação da comunidade e auto-ajuda) mobiliza e organiza uma comunidade. Tal significa que a organização social da comunidade é alterada, de modo mais ou menos intenso. Por conseguinte, o mobilizador ou animador é um agente de mudança social ou catalisador. Compreender a natureza da mudança social, a sua natureza social, numa comunidade, é uma ferramenta indispensável para o mobilizador.

UM ANIMADOR DEVE POSSUIR CONHECIMENTOS ACERCA DA SOCIEDADE

Pode ser perigoso levar a cabo acções de mudança sobre algo acerca do qual não se possui qualquer tipo de conhecimento. Por conseguinte é da responsabilidade do mobilizador aprender algo acerca das ciências antropologia e sociologia(1).

Um mobilizador é um sociólogo aplicado, por isso deve possuir conhecimentos acerca dos aspectos mais importantes sobre os quais pretende actuar. (Apesar da mobilização ser uma ciência social aplicada, não é equivalente à Engenharia Social. Ver Engenharia Social).

Apesar da sociologia ser de um modo geral ensinada a nível universitário, e de que hoje em dia um cientista social necessita possuir um Doutoramento, não é necessário que um mobilizador receba toda esta educação formal. Começando nesta formação, e talvez fazendo um pouco de pesquisa a título individual em literatura adequada, um mobilizador pode aprender tudo o que necessita saber sobre a sociologia para compreender a natureza social das comunidades.

O aspecto mais importante a aprender já foi mencionado: um organismo social tal como uma comunidade possui uma vida própria que transcende as vidas dos indivíduos que a compõem. Estes indivíduos sofrem as suas próprias mudanças no seu processo de desenvolvimento enquanto seres humanos. Eles nascem, crescem, tornam-se adultos, casam-se, empregam-se, alguns tornam-se lideres reconhecidos, têm filhos e morrem. Todas estas mudanças pessoais nos indivíduos, por si mesmas, não levam à mudança na sociedade ou comunidade. Na realidade, como são reconhecidas, elas contribuem para a estabilidade da sociedade, e para a continuação da comunidade.

O segundo aspecto a aprender também foi resumidamente mencionado. Todos os aspectos sociais e culturais são transmitidos através de símbolos e não de genes. O desenvolvimento da comunidade, que é uma forma de mudança social, não requer cirurgia estética mas sim mudanças nas mensagens que os símbolos transmitem.

MANTENHA-SE CONSCIENTE DOS ELEMENTOS ESSENCIAIS DA SOCIEDADE

Ao passo que a sociologia por si mesma pode ser interessante, o mobilizador precisa saber mais acerca dela de modo a ser um melhor mobilizador. Dado que a noção de "comunidade" é uma construção social, é importante compreender a natureza do que é ser "social".

O que é, por exemplo, a "cola" que mantem uma comunidade (ou qualquer organização social) junta? Como podem os indivíduos ser interdependentes entre si, mesmo quando acreditam que são organismos independentes? Essas crenças, ainda que não sejam exactas, possuem algum objectivo que apoie e sustente uma organização social?

É importante que o animador se aperceba das interligações entre as dimensões culturais (descritas posteriormente) que constituem uma comunidade. Ainda que os cientistas sociais discordem acerca da natureza exacta dessas interligações, todos estão de acordo em como a característica básica da sociedade (e, por conseguinte, das comunidades que compõem uma sociedade) é o facto de que elas se encontram interligadas.

Uma comunidade, tal como outras instituições sociais, não é uma mera colecção de pessoas individuais; é um conjunto em constante mudança de relacionamentos, incluindo as atitudes e comportamentos dos seus membros.

Lembre-se que o seu objectivo é o empoderamentoda comunidade. Saber o que é uma comunidade, e a sua natureza social e cultural, vai ajudar-lhe a saber exactamente o que é ser empoderado através dos seus esforços.

A CULTURA APRENDE-SE

Mencionamos anteriormente que uma comunidade é um organismo cultural, e que é algo que ultrapassa os próprios indivíduos que a constituem. A cultura nas ciências sociais é algo mais que ópera e ballet, mas o que é ao certo?

A cultura consiste de todos os aspectos, incluindo as acções e as crenças que os seres humanos (enquanto seres vivos) aprendem e que são a essência da humanidade. A cultura inclui o comportamento adquirido, mas não os aspectos que são geneticamente determinados. Ao passo que parte da cultura é armazenada e transmitida durante a infância (como por exemplo, aprender a falar), o restante aprende-se na idade adulta.

Quando o animador se dedica à promoção da mudança social, ela ou ele está a promover a aprendizagem de novas ideias e comportamentos.

Quando uma cultura se aprende inicialmente por uma criança para que se torne um adulto, esse processo denomina-se de interiorização ou socialização.Quando se reaprende uma outra cultura, tal como quando uma pessoa se muda para uma sociedade diferente, ou quando a comunidade que rodeia o indivíduo se modifica, então o processo denomina-se aculturação. Enquanto mobilizador, vai estar muito envolvido na criação de estímulos para mudar socialmente uma comunidade e como tal será confrontado com o processo de aculturação. Por conseguinte, as competências na área de educação para adultos são essenciais.

A definição sociológica de "cultura", que significa "sistema sócio-cultural", e que consiste da própria sociedade, não é a definição corrente de cultura, na qual as pessoas incluem normalmente a dança e a percursão, ou apenas as artes (que pertencem a apenas uma das seis dimensões de cultura, a estética).

A CULTURA TRANSCENDE OS SEUS SERES HUMANOS

A cultura é super-orgânica (e uma comunidade é cultural). Compreender o conceito de super-orgânico é importante para compreender uma comunidade.

Tal como o nível orgânico se baseia no inorgânico (as células vivas são constituidas por átomos sem vida, etc.; um cão ou uma árvore não são uma célula apesar de serem constituidos por células), também o super-orgânico se baseia no orgânico (a sociedade não é um ser vivo apesar de ser composta por seres vivos). Isto implica que durante a animação (mobilização e organização) de uma comunidade, o animador deve ser sempre capaz de separar os acontecimentos da comunidade em geral daqueles que afectam os indíviduos em particular.

Usamos aqui o termo "transcender" no sentido de "ir além de". Não possui nenhuma conotação religiosa neste contexto.

Tal como uma árvore, enquanto ser vivo, transcende os seus átomos, moléculas e células que a compõem, também uma comunidade, ou qualquer organização social, transcende os seres vivos individuais que a constituem. A árvore e o cão não existiriam sem os seus átomos ou células, assim como uma comunidade não existiria sem os seus seres vivos individuais.

Os princípios que afectam um átomo ou uma célula (de um cão ou de uma árvore), não são os mesmos que afectam o cão ou a árvore. As forças que afectam um ser vivo individual (numa comunidade) não são as forças que afectam o desenvolvimento de uma comunidade.

Um bom mobilizador deve compreender a natureza da mudança social numa comunidade e ser capaz de identificar as suas diferenças em relação às mudanças sofridas pelos indivíduos nessa comunidade. Nesse sentido, o mobilizador deve desenvolver uma perspectiva social, e saber como uma comunidade transcende os seus indivíduos.

UMA COMUNIDADE É UM ORGANISMO OU SISTEMA SUPER-ORGÂNICO

Uma comunidade pode ser considerada como sendo um organismo (i.e. tem a sua própria organização, possui órgãos). Ela vive e funciona ainda que os seus membros se movam, nasçam ou desapareçam.

Tal como uma célula viva, planta ou animal, transcende os seus átomos, também uma instituição, padrão de comportamentos ou comunidade transcende os seus indivíduos. O comportamento de um átomo ou o ciclo de vida de uma molécula decorre de acordo com um conjunto de forças distintas daquelas que existem numa planta ou animal onde se encontra esse átomo ou molécula.

Por isso, também um ser humano está sujeito a um conjunto de forças distinto daquele que afecta uma organização social (tal como uma comunidade) na qual está inserido. Uma crença, por exemplo, é respeitada por pessoas, mas essa crença pode continuar a existir muito tempo depois das primeiras pessoas terem desaparecido. O mesmo princípio é aplicável a uma instituição como o casamento, a uma organização como a força aérea, a uma cidade como Kumasi, um hábito como o aperto de mãos, uma ferramenta como a enxada, ou um sistema como o marketing. Todos estes transcendem os indivíduos que os utilizam.

Uma sociedade é consequentemente um sistema - não um sistema inorgânico como um motor, nem um sistema orgânico como uma árvore, mas sim um sistema super-orgânico constituido por ideias apreendidas, expectativas e comportamento de seres humanos. Pense em três niveis de organização: inorgânico, orgânico e super-orgânico.

Apesar de uma comunidade ser um sistema cultural (no sentido em que transcende os indivíduos) não se pode assumir que uma comunidade é uma unidadeharmoniosa. Não o é. Está recheada de facções, lutas e conflitos, baseados em diferenças tais como a de género, religião, acesso à riqueza, etnia, classe, nível de educação, rendimento, propriedade, língua e muitos outros factores.

De modo a promover a participação e desenvolvimento da comunidade, o animador tem a tarefa de juntar essas facções, motivar o espírito de tolerância e de equipa, e obter decisões consensuais. Para que possa promover a mudança social numa comunidade, é necessário saber como esse sistema funciona, e só assim saberá como reage às mudanças e às suas intervenções. Tal como um engenheiro (um cientista de física aplicada) deve saber o modo de funcionamento de um motor, também o facilitador de uma comunidade (um cientista social aplicado) deve conhecer o modo de funcionamento de uma comunidade.

Para saber o modo como funciona uma comunidade, não se deve antropomorfisar uma comunidade. "Antropomorfisar" significa assumir e atribuir características humanas a um ser não humano (e.g. pensar que os patos e os ursos têm "famílias" quando o conceito de "família" é uma instituição humana). Uma comunidade não fala nem pensa, não tem sentimentos e não se comporta como um ser humano. É uma entidade super-orgânica, e que se move, reage, cresce e se comporta com princípios, forças e mecanismos diferentes dos de um ser humano.

DIMENSÕES DE CULTURA; DIMENSÕES DE COMUNIDADE

Quando afirmamos que uma comunidade não é igual a um ser humano, estamos a afirmar que não possui emoções, uma cabeça, pensamentos, pernas ou um passatempo. No entanto está constituida por partes diferentes que são aplicáveis a organizações sociais e cultura e não necessariamente a seres humanos individuais.

Uma maneira importante de analisar uma comunidade consiste em analisá-la nas suas diversas facetas, ou seja, usar as suas seis dimensões culturais". Utilizamos o termo "dimensão" dado que se trata de categorias analíticas, estabelecidas por nós humanos, e que não são baseadas em partes observáveis (tais como as partes de um corpo: cabeça, braços, pernas). Num dos módulos de formação, Investigação da Comunidade, pode verificar que estas seis dimensões culturais (juntamente com a geografia e a demografia) podem ser usadas como categorias para organizar os temas a investigar, observar e compreender a comunidade onde tenciona trabalhar.

Em matemática, um objecto possui três dimensões, a saber, altura, largura e profundidade, e pode possuir quatro, caso consideremos o tempo. Independentemente do seu tamanho ou de como se pode decompôr esse objecto, cada uma das suas partes continuará a ter cada uma das quatro dimensões. Tal é aplicável também uma entidade sócio-cultural, como uma comunidade. Indepentemente do seu tamanho ou dos diferentes modos como se pode decompôr cada uma das partes da cultura, a comunidade será sempre constituida por cada uma das suas seis dimensões.

Estas dimensões da comunidade incluem os aspectos:

  1. Tecnológico,
  2. Económico,
  3. Político,
  4. Institucional (social),
  5. Valores Estéticos, e
  6. Crenças e Conceitos.

Cada uma destas dimensões de cultura são transmitidas através de símbolos (e não de genes) e consistem de sistemas de ideias e comportamentos adquiridos. Elas não são "aspectos" da cultura; são dimensões. As dimensões culturais variam em tamanho mas, por definição, fazem parte do conjunto total.

Todas elas são sistemas dentro de cada sistema social (ou cultural). Baseiam-se no comportamento adquirido, que transcende os indíviduos que aprenderam as diferentes partes do sistema. Se qualquer uma das dimensões da cultura não está presente, por definição, todas são inexistentes.

Não se pode "ver" uma dimensão da cultura ou sociedade, do mesmo modo como se vê uma pessoa. Elefante. Cada indivíduo manifesta cada uma das seis dimensões de cultura. Para ser socialmente consciente, o animador deve ser capaz de analisar cada uma das seis dimensões, e as suas interligações, ainda que ele(a) apenas observe indivíduos e não essas dimensões.

A DIMENSÃO TECNOLÓGICA DA COMUNIDADE

A dimensão tecnológica da comunidade é o seu capital, as suas ferramentas e competências, e os modos de lidar com o ambiente físico. É a relação entre humanidade e natureza.

Lembre-se que não são apenas as ferramentas físicas em si que constituem a dimensão tecnológica da cultura, mas as ideias e comportamentos adquiridos que permitem aos humanos inventar, usar e ensinar outros sobre essas ferramentas. A tecnologia é uma dimensão cultural tanto como as crenças e os padrões de interacção; é simbólica. A tecnologia é cultural.

Os economistas por vezes denominam esta dimensão cultural de "capital real" (em oposição a capital financeiro). Trata-se de algo valioso que não é produzido para consumo directo, mas para ser usado no aumento de produção (e por conseguinte mais riqueza) no futuro; investimento.

No desenvolvimento de capacidade, é um dos dezasseis elementos de força que muda (aumenta) à medida que uma organização ou comunidade fica mais forte. Na guerra contra a pobreza, a tecnologia fornece um importante conjunto de armas.

Para um indivíduo ou uma família, a tecnologia inclui a sua casa, mobília ou equipamentos do lar, incluindo os utensílios de cozinha, electrodomésticos, portas, janelas, camas e lâmpadas. A linguagem, uma das mais importantes características dos seres humanos, está incluida na dimensão tecnológica (trata-se de uma ferramenta). Também engloba os meios de comunicação tais como a rádio, televisão, livros e máquinas de escrever (actualmente substituidas pelos computadores).

Numa organização, a tecnologia inclui secretárias, computadores, papel, cadeiras, canetas, escritórios, telefones, casas-de-banho e cantinas. Algumas organizações possuem tecnologias específicas: bolas de futebol e equipamentos nos clubes de futebol, quadros negros, mesas e giz nas escolas, altares e pias nas igrejas, armas e bastões nas forças policiais, transmissores e microfones nas estações de rádio.

Numa comunidade, a tecnologia comum inclui infrastruturas tais como as casas-de-banho públicas e pontos de abastecimento de água, estradas, mercados, clínicas, escolas, sinais de trânsito, parques, centros comunitários, bibliotecas, complexos desportivos. A tecnologia comunitária de propriedade privada pode incluir lojas, fábricas, casas e restaurantes.

Quando um facilitador encoraja uma comunidade a construir uma latrina ou um poço, uma nova tecnologia é introduzida. Um poço (ou latrina) é uma ferramenta (e um investimento) à semelhança de um martelo ou de um computador.

De um modo geral (ou seja, existem excepções), a tecnologia é talvez a mais fácil das seis dimensões para introduzir mudanças culturais e sociais. É mais fácil introduzir um rádio transistor do que uma nova crença religiosa, um novo conjunto de valores ou uma nova forma de família. Paradoxalmente, a introdução de uma nova tecnologia (por invenção ou empréstimo) levará a mudanças em todas as outras cinco dimensões da cultura.

Lembre-se que existem sempre excepções; na sociedade Amish, por exemplo, existe uma decisão comunitária consciente para resistir à introdução de uma nova tecnologia. Eles dependem da preservação de antigas tecnologias (sem tractores, carros ou rádios) tais como carruagens de tracção animal e arados, para fortalecer o seu sentido de identidade cultural.

Essas mudanças não são facilmente previsiveis, nem sempre conduzem na direcção pretendida. Após a sua concretização podem parecer lógicas, apesar de não terem sido previstas anteriormente.

Ao longo da história humana, a tecnologia, de um modo geral, tem sofrido mudanças ao tornar-se mais complexa, mais ofisticada e com um maior controle energético. Uma tecnologia nem sempre é imediatamente substituida por outra (apesar dos automóveis terem substituido as carruagens de tracção animal ao longo de um século de mudança).

Normalmente as mudanças acumulam-se, com as ferramentas e tecnologias antigas a desaparecerem quando se tornam menos úteis, menos eficientes e mais caras. De um modo geral ao longo da história, as colheitas e a caça foram preteridas a favor da agricultura (excepto em pequenos nichos de grupos reduzidos). Similarmente, a agricultura deu lugar à indústria. As pessoas que ainda utilizam tecnologias antigas e menos eficientes encontram-se geralmente em situações de marginalização e de pobreza. Onde a tecnologia é altamente avançada (por exemplo, tecnologia da informação, computadores, internet), ela é utilizada por uma pequena percentagem da população mundial.

A tecnologia que possa ser introduzida por mobilizadores pode pertencer aos sectores da medicina (clínicas e medicamentos) e saúde (água potável, higiene), establecimentos escolares ou mercados cobertos nas áreas rurais. Nesses locais, os residentes de um modo geral estão conscientes dessas tecnologias; mas pura e simplesmente não as possuiam, antes de se mobilizarem para as obter. O facilitador deve estar preparado para compreender os efeitos das outras dimensões culturais na introdução de uma mudança na dimensão tecnológica.

A DIMENSÃO ECONÓMICA DA COMUNIDADE

A dimensão económica da comunidade consiste nas diferentes formas e meios de produção e distribuição de bens e serviços (riqueza) que são escassos e úteis, quer seja através de oferendas, obrigações, trocas, mercado ou benefícios estatais.

Não são os elementos físicos tais como o dinheiro que constituem a dimensão económica da cultura, mas sim as ideias e comportamentos das pessoas que dão valor ao dinheiro (ou outros elementos) por parte daqueles que criaram os sistemas económicos vigentes. A riqueza não é apenas dinheiro, tal como a pobreza não é apenas a falta de dinheiro.

A riqueza está entre os dezasseis elementos da força da comunidade ou capacidade de organização. Quando a organização ou comunidade possui mais riqueza (que pode controlar enquanto organização ou comunidade) então possui mais poder e mais capacidades para alcançar aquilo que deseja.

Ao longo da história dos seres humanos, a tendência geral na mudança económica tem sido a progressão desde o mais simples até ao mais complexo. Um sistema não substituiu automaticamente o outro, mas novos sistemas são adicionados, e os menos úteis foram lentamente desaparecendo.

Em pequenos grupos simples, a riqueza (tudo o que é escasso e útil) era distribuida de acordo com as obrigações familiares. Quando alguém regressava a casa com alguma comida ou roupas, eram distribuidas pelos outros membros da família sem qualquer expectativa de obter benefícios imediatos em troca.

À medida que a sociedade se torna mais complexa e os diferentes grupos entram em contacto com todos os outros, começou a existir comércio através de diferentes mercados. A distribuição entre cada grupo de famílias mantém-se quase igual. À medida que os mercados se tornam mais complexos e extensos, acrescentaram-se mais instituições para simplificar a contabilidade: moedas, contas, bancos, crédito, cartões de crédito, cartões de débito. Tais instituições não eliminaram imediatamente os mecanismos iniciais, mas as doações e distribuições familiares tornaram-se eventualmente menores em comparação com o largo leque de sistemas de distribuição, e as trocas directas tornaram-se menos importantes.

Lembre-se que o dinheiro em si não possui qualquer valor intrínseco. Só possui valor porque a sociedade - a comunidade e a cultura - lhe atribuiu algum valor. Uma nota de cem euros, por exemplo, pode ser usada para acender uma fogueira ou para enrolar tabaco para fazer um cigarro, mas o seu valor monetário é muito superior.

Em qualquer comunidade pode encontrar diferentes formas de distribuição de riqueza. É importante que aprenda quais elas são, e que coisas podem ser dadas, trocadas, compradas e vendidas. Em muitas sociedades, diversos tipos de riqueza podem ser distribuidos através da compra, tais como favores sexuais, esposos, hospitalidade, crianças, diversão. Tudo pode variar. Aprender o modo como podem ser distribuidas e sob que condições e entre quem (dado que são variáveis) faz parte da investigação que precisa realizar.

Quando uma comunidade decide distribuir água usando uma taxa fixa para todas as residências, ou distribui-la de acordo com um pagamento por cada contentor de água quando este é recolhido, então a escolha está a ser feita entre dois sistemas muito diferentes da distribuição económica.

O animador deve encorajar a comunidade a escolher o que quer de modo a ser mais consistente com os valores e atitudes vigentes. (Um bom mobilizador não tentará impôr a sua noção do que pode ser o melhor sistema de distribuição; os membros da comunidade, todos eles, devem tomar uma decisão consensual).

A DIMENSÃO POLÍTICA DA COMUNIDADE

A dimensão política da comunidade consiste dos seus diferentes modos e meios de distribuição de poder, influência e tomada de decisões. Não é o mesmo que ideologia, a qual pertence à dimensão dos valores. Inclui os diferentes tipos de governos e sistemas de gestão, mas não está limitada a eles. Também inclui o modo como as pessoas em grupos reduzidos ou informais tomam decisões quando não possuem um líder reconhecido.

O poder político encontra-se entre os dezasseis elementos do poder da comunidade ou capacidade de organização. Quanto mais poder político e influência se possui, mais fácil é alcançar o que se deseja.

Um animador deve ser capaz de identificar os diferentes tipos de líderes numa comunidade. Alguns podem possuir autoridades burocráticas ou tradicionais; outros podem ter qualidade pessoais carismáticas. Ao trabalhar com uma comunidade, o animador deve ser capaz de ajudar a desenvolver o poder existente e o sistema de tomada de decisão de modo a promover a unidade da comunidade e da tomada de decisão do grupo para que beneficie toda a comunidade, e não apenas os interesses velados.

Na história dos seres humanos, no início, a liderança (poder e influência) era dispersa, temporária e mínima. Num pequeno grupo de caçadores, um líder pode ser qualquer pessoa que sugira e organize uma caça. Em pequenos grupos não existem chefes, anciãos ou reis, e estes grupos são geralmente denominados pelos antropologistas de "acéfalos" (sem cabeça).

À medida que a história progride, os sistemas políticos tornam-se mais complexos, e o poder e a influência aumentam e afectam um maior número de pessoas. Os níveis de sofisticação política, e da hierarquia, vão desde "acéfalos", grupos e tribos até reinos e nações.

No grupo mais simples, existe uma diferença muito reduzida entre o nível de poder e influência do líder e do membro mais inferior do grupo. Estabeleça comparações entre o exemplo anteriormente apresentado e a diferença entre o nível de poder e influência entre o Presidente dos Estados Unidos e o de um empregado responsável pela limpeza das casas-de-banho de um hotel modesto em Washington.

As comunidades, incluindo aquelas onde trabalha, possuem algum tipo de sistema político, e alguma distância entre os seus níveis mais superiores e inferiores de poder de indivíduos e grupos. A sua primeira tarefa é compreender o seu modo de funcionamento, como o poder e a influência são distribuidos (não o são sempre da mesma maneira) e quais as mudanças em curso.

Possuirá alguma influência nessa distribuição de poder ao estimular a formação de um comité de desenvolvimento. E também será responsável por encorajar um aumento da complexidade política caso esse seja o primeiro comité desse género nessa comunidade.

A DIMENSÃO INSTITUCIONAL DA COMUNIDADE

A dimensão social ou institucional da comunidade é constituida pelos diferentes modos como as pessoas agem, interagem, reagem e como esperam que os outros ajam e interajam. Inclui determinadas instituições como o casamento ou amizade, papeis como o de mãe ou polícia, estatuto ou classe, e outros padrões de comportamento humano.

A dimensão institucional da sociedade consiste no que muitos não sociólgoos pensam intuitivamente quando pensam em "sociologia". No entanto, trata-se apenas de uma das seis dimensões da organização social (cultura).

A dimensão está relacionada com o modo como as pessoas agem em relação aos outros, as suas expectativas, pressupostos, juízos de valor, previsões, respostas e reacções. Está relacionada com os padrões de relacionamento por vezes identificados como papeis a desempenhar ou estatutos, e com a formação de grupos e instituições derivados desses padrões.

Uma "sogra", por exemplo, é simultaneamente um papel (com um estatuto) e uma instituição. Numa comunidade, a organização social da comunidade é a soma total de todas essas interligações e padrões.

O nível de organização (ou complexidade organizacional), o grau de divisão de tarefas, a extensão da divisão de papeis e funções, é outro dos dezasseis elementos da força da organização ou capacidade de organização. Quanto mais organizado e mais eficientemente organizado se é (e, enquanto mobilizador, pode ajudar a que se seja ainda mais), então possuirá maior capacidade para alcançar os seus objectivos comunitários ou organizacionais.

Tal como com as outras dimensões, ao longo da história, o tendência geral temsido passar do mais simples ao mais complexo. Nas sociedades iniciais simples, a família era a comunidade, e também a sociedade. A família definia todos os papeis e estatutos. As sociedades tornaram-se mais complexas, primeiro as famílias tornaram-se mais complexas, seguidas de um novo desenvolvimento dos relacionamentos não-familiares que foram reconhecidos. Posteriormente, a importância relativa da própria família entrou em declínio em comparação com todos os outros tipos de relacionamentos.

Cada vez que um novo tipo de papel a desempenhar é criado, com os seus deveres, responsabilidades, direitos e padrões de comportamento esperados, então a sociedade torna-se mais complexa. Se se encorajar a formação de um novo comité de desenvolvimento, com as suas posições oficiais e membros, a comunidade tornar-se-á muito mais complexa.

Uma pequena comunidade rural sem uma clínica ou escola é, muito provavelmente, composta de residentes que são relacionados entre si através de laços de sangue e/ou casamento. Se se estimular essa comunidade para que construa uma escola ou clínica, com professores ou profissionais de saúde pagos (de um modo geral de origem externa à própria comunidade), então aumenta a complexidade social dessa comunidade.

Nesse sentido, talvez a dimensão social seja semelhante à dimensão tecnológica dada uma menor dificuldade (comparada com as restantes dimensões, especialmente as duas últimas) em introduzir mudança social. Como em todas as seis dimensões, uma mudança numa dimensão, tal como a social, terá efeitos em todas as outras cinco dimensões.

Para que o animador seja bem-sucedido, ela ou ele tem de saber quais são as instituições locais, quais os papeis diferentes que são desempenhados pelos homens e mulheres, e quais são as principais formas de interacção social.

A DIMENSÃO DE VALORES ESTÉTICOS DA COMUNIDADE

A dimensão de valores estéticos da comunidade consiste de uma estrutura de ideias, por vezes paradoxais, inconsistentes, ou contraditórias, que as pessoas possuem acerca dos conceitos de bom e mau, bonito e feio, certo ou errado, e que são as justificações que as pessoas apresentam para explicar as suas acções.

Os três eixos ao longo dos quais as pessoas fazem juizos de valores são todos dependentes do que aprenderam desde a infância. Incluem julgar entre o certo e errado, entre bom e mau, entre bonito e feio, com base nos valores sociais e comunitários. Não são adquiridos através da informação genética, mas através da socialização. O que implica que possam ser reaprendidos e que possamos mudar os nossos juizos de valor.

No entanto, é verdadeiramente dificil mudar os valores de uma comunidade, em particular se os residentes estão conscientes que há uma tentativa de os mudar. Esses valores mudam à medida que os estandares da comunidade evoluem, mas essa mudança não pode ser acelerada ou direccionada por uma influência externa ou manipulação consciente.

Os estandares comunitários partilhados são importantes para a identidade pessoal e da comunidade; alguém é basicamente os valores em que acredita. O grau de partilha de valores e respeito pelos valores de outrém, na comunidade ou pelos membros da organização, é um componente importante entre os dezasseis elementos de força e capacidade.

Os valores têm tendência a mudar à medida que a comunidade se torna mais complexa, mais heterogénea, e mais ligada ao mundo. As mudanças nos valores têm tendência a causar mudanças na tecnologia e organização social ao contrário do que acontece com palestras ou aulas sobre mudanças directas.

Aparentemente não existe nenhuma direcção previsivel da mudança na história humana, os juizos de valor tornam-se mais liberais ou tolerantes ou católicos ou eclécticos - ou talvez não.

Não é fácil prever os valores estandardizados de uma comunidade antes de viver junto dessa comunidade e descobrir como se relacionar nessa comunidade. No entanto, devido à sua importância, é necessário que o mobilizador aprenda o mais possivel acerca dos estandares da comunidade, e que não assuma que eles sejam os mesmos que na sua própria comunidade.

One overall trend is that, in more complex communities, with more inequality, the gap between those with highest prestige (a value assessment) and those with lowest, is greater.

Ainda que a introdução de novos bens e serviços numa comunidade possa levar eventualmente a mudanças nos estandares da sociedade, tudo o que o mobilizador propõe deve ser encarado como algo incluido no conjunto de valores vigentes da comunidade.

Sempre que um animador introduz novos modos de realizar tarefas na comunidade, os valores vigentes, ainda que contraditórios e variados, devem ser considerados.

A DIMENSÃO CRENÇAS E CONCEITOS DA COMUNIDADE

A dimensão crenças e conceitos da comunidade é outra estrutura de ideias, por vezes também contraditórias, que as pessoas possuem acerca da natureza do universo, do mundo que as rodeia, o seu papel a desempenhar nesse mundo, causas e efeitos, a natureza do tempo, matéria e comportamentos.

Esta dimensão é por vezes considerada como sendo a religião do povo. Trata-se de uma categoria mais vasta, e também inclui crenças não-religiosas, como por exemplo, que o homem criou Deus à sua própria imagem. Adicionalmente, inclui as crenças partilhadas acerca do modo como o universo foi criado, como funciona e o que é a realidade. No fundo trata-se de religião - e algo mais.

Quando deixa cair um lápis ao chão, demonstra a sua crença na gravidade. Quando afirma que o sol nasce de manhã (não é verdade; a Terra gira) expressa a sua visão do mundo.

Se o mobilizador é visto como alguém que está a atacar as crenças do povo, o seu trabalho pode ser prejudicado, pode aparecer oposição ao mobilizador e aos seus objectivos, com a consequente derrota enquanto mobilizador. Quer se oponha ou não às crenças locais, deve ser visto como alguém que não as quer alterar.

Em toda a história do ser humano, a tendência geral da mudança tem sido uma diminuição do número de divindades, e uma redução das diferenças entre o espaço sagrado e profano em relação ao espaço secular. Desde o politeísmo local com diversos deuses, os humanos avançaram em direcção a um politeísmo com um menor número de deuses, seguidamente o monoteismo (apenas um deus) e desde então houve um aumento da percentagem de pessoas que não acreditam em deus.

Na experiência da espécie humana, aparentemente todos os grupos com deuses tradicionais locais tendem a ser mais tolerantes a outros deuses do que as religiões denominadas "universais" que afirmam que apenas elas possuem a verdadeira resposta. Enormes guerras têm sido travadas devido às religiões (a ironia é que a maioria das religiões apela à paz e tolerância), e este deve ser um aviso para o mobilizador acerca do nivel em que algumas pessoas estão ligadas às suas crenças.

O animador deve aprender, estudar e estar consciente das crenças que existem na comunidade. Para ser um catalisador eficiente da mudança social, o animador deve fazer sugestões e promover acções que não ofendam as crenças existentes e que sejam consistentes com, ou pelo menos, apropriadas às crenças e conceitos existentes relativas ao modo como o universo funciona.

TODAS AS SEIS DIMENSÕES ESTÃO PRESENTES EM CADA PEQUENA PORÇÃO DE CULTURA

O aspecto importante a lembrar é que em qualquer sociedade, instituição, comunidade e interacção entre indivíduos existe um elemento de cultura que inclui algo de cada uma das seis dimensões da cultura. Todas estas dimensões são aprendidas após o nascimento. O recém-nascido é como um animal, e não ainda um ser humano, mas ele ou ela começa a aprender a cultura (humanização) de modo imediato (por exemplo, durante o aleitamento materno) através da interacção com outros seres humanos, e por conseguinte começa a tornar-se um humano. (Muitos afirmam que este processo de humanização começa no ventre materno.)

Este processo de aprendizagem, e por conseguinte de existir enquanto ser humano, continua até à morte. Se não está a aprender, então está morto.

Quando se encontra numa reunião comunitária, numa sala de aulas, quando tem um encontro com alguém, onde quer que se encontre, é parte da cultura, parte do sistema sócio-cultural, e pode observar todas as seis dimensões. Por vezes, quando tenta observar objectivamente a cultura seguindo o método científico, esquecemos que somos nós mesmos parte de uma cultura.

As ferramentas que usamos, as interacções que efectuamos, as nossas crenças e valores, formam todos parte da nossa cultura e da nossa existência enquanto animais sociais. Se realizamos o nosso trabalho como mobilizadores numa comunidade distinta daquela em que crescemos, a nossa cultura será diferente da dos residentes dessa comunidade. Ver: Aculturação.

Não estamos livres dessa obrigação caso estejamos a tentar mobilizar a nossa própria comunidade. Um provérbio que ilustra um princípio antropológico é, "É um peixe estranho aquele que sabe da existência da água."

Devido à nossa própria existência, e ao nosso entendimento acerca de nós mesmos, um produto da nossa cultura e o nosso processo de socialização nessa mesma cultura é não estarmos conscientes dessa cultura. Tal como um peixe que nunca esteve fora de água (e por conseguinte não pode comparar a água com um ambiente sem água), não podemos existir fora da nossa cultura.

AS INTERLIGAÇÕES TÊM UM USO PRÁTICO

Para o mobilizador, e para todos os que se dedicam a qualquer actividade na área do desenvolvimento, a parte importante de todas essas actividades consiste na variedade de interligações entre essas dimensões culturais, que podem estar interligadas de modo causal e funcional. Tomemos com exemplo a tecnologia (em oposição às ideias popularmente aceites), tanto as ferramentas como as capacidades necessárias para as utilizar fazem parte da cultura e do sistema social à semelhança das crenças, danças e modos de distribuir riqueza.

Ao realizar mudanças em qualquer uma das dimensões existem repercussões em qualquer uma das outras dimensões. Para introduzir um novo método de obtenção de água, por exemplo, requer a introdução de novas instituições para manter o novo sistema de água.

Aprender novas maneiras de realizar tarefas requer uma aprendizagem de novos valores e novas percepções. As mudanças em qualquer dimensão vão despoletar mudanças, tal como as pequenas ondulações na água de um lago calmo quando se atira uma pedra, e ultimamente, todas as seis dimensões vão mudar.

Ignorar essas interligações enquanto se promove a transferência de tecnologia envolve riscos (pode levar a resultados inesperados e indesejáveis). É necessário observar cuidadosamente as mudanças na comunidade onde está a trabalhar, e analisar as repercussões na mudança em cada dimensão porque afectam todas as outras dimensões.

AS INTERLIGAÇÕES AFECTAM A MUDANÇA SOCIAL

Alterar algo numa dimensão cultural não só requer mudanças noutras dimensões como provoca mudanças nessas dimensões. Por conseguinte, uma avaliação do impacto social deve ser realizada para todos os projectos, independentemente da extensão do seu campo de acção.

À medida que se torna mais experiente, vai começar a aperceber-se das mudanças resultantes da introdução de novas maneiras de realizar tarefas. Quanto mais mudanças consegue prever, mais preparado está para elas. Quanto mais previsões faça das mudanças em cada dimensão, mais pode modificar as suas acções de modo a que a comunidade possa mudar como desejado.

No entanto, lembre-se que não é um engenheiro social, e que não pode determinar com exactidão o modo como a comunidade vai reagir ao seu trabalho.

Ver: Preservar a Cultura.

CONCLUSÃO; O MOBILIZADOR DEVE COMPREENDER A COMUNIDADE

Para ser um mobilizador mais eficiente, para empoderar ou fortalecer as comunidades, precisa conhecer a natureza das comunidades, e o seu comportamento. As comunidades são organizações sociais ou culturais e, consequentemente, são caracterizadas pelas seis dimensões culturais. As comunidades não são como os seres humanos, mas crescem e mudam de acordo com o seu próprio conjunto de princípios.

A chave para compreender essas características e princípios é o reconhecimento dessas seis dimensões da cultura e as suas interligações. As interligações entre essas dimensões culturais(2) não são simples nem facilmente previsiveis.

O animador deve estar consciente da sua existência, e encorajar continuamente a observação, análise, partilha de ideias, leitura e frequência de aulas ou seminários. Ao trabalhar com as comunidades, o animador deve aprender muito mais acerca da sua cultura e da dinâmica das suas dimensões culturais.

O que é comunidade? A resposta não é simples nem rapidamente definida. No entanto, é importante que todos os activistas compreendam.

Rodapé:(1) Enquanto ciências, não existe qualquer diferença entre a sociologia e a antropologia. Ambas têm objectos de estudo idênticos e usam os mesmos métodos científicos. A sua diferença reside nas diferentes histórias. A antropologia deve a sua origem ao imperialismo europeu e à diletante colecção de hábitos e práticas exóticos por parte dos aristocratas que buscavam passatempos interessantes para quebrar a sua monotonia. A sociologia deve a sua origem à revolução industrial, ao crescimento de diferenças enormes entre os donos das fábricas e dos que nada mais tinham para vender além do seu trabalho. O estudo da diferença de classes foi motivado por um interesse em mitigar, ou mesmo eliminar, os abusos dessas diferenças de poder. A antropologia (a palavra) é formada pela junção de duas palavras em Latim, enquanto que a sociologia é formada pela junção ilegítima de um palavra em Grego com outra em Latim.

Rodapé:(2) Esta dissertação não é teórica, mas tem como objectivo apresentar ao mobilizador a ideia de que a comunidade é uma entidade sócio-cultural para além do mero conjunto de indivíduos, e que essa compreensão é necessária para guiar a intervenção de mobilização enquanto factor de mudança social. Marx, por exemplo, pensava que as duas dimensões culturais subjacentes, tecnológica e económica, mudam de acordo com determinado tipo de dialéctica (i.e. de agrícola a industrial), e as restantes dimensões mudam ao adaptar-se a essas mudanças materialistas. Weber, pelo contrário, pensava que as duas dimensões superiores, valores (ideologia) e percepções (crenças) eram os primeiros a mudar (tal como na Reforma Protestante), e que as restantes quatro dimensões mudavam como resultado (i.e. a Revolução Industrial). Hoje em dia não concebemos as interligações entre as dimensões de modo tão simplista (e existe um debate considerável em torno à interpretação), mas ainda assim se reconhece que elas estão relacionadas entre si. Ver: Marx e Weber.

Ver (fotografias de): http://faculty.olympic.edu/cbarker/deadsociologistsociety.htm

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Última actualização: 2012.06.27

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